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Voltar Publicado em: quarta-feira, 28 de outubro de 2020, 3h11

Preço recorde do suíno no mercado doméstico e volumes exportados até setembro já superam o total de 2019

No acumulado destes nove meses o Brasil já atingiu o recorde histórico anual de exportações, com quase 20 mil toneladas a mais que todo o embarque do ano passado

Embora tenha havido uma redução das exportações de carne suína em setembro em relação aos meses anteriores (tabela 1), com 76.054 toneladas de carne in natura embarcadas, no acumulado destes nove meses o Brasil já atingiu o recorde histórico anual de exportações, com quase 20 mil toneladas a mais que todo o embarque do ano passado (657 mil toneladas). As projeções indicam que até o final do ano o Brasil irá exportar mais de 900 mil toneladas. Sem dúvida, este recorde de embarques tem contribuído muito para manter o preço do suíno vivo e das carcaças em patamares elevados. A produção também aumentou expressivamente, conforme já apontou o IBGE no primeiro semestre do ano, o mercado interno está com a demanda aquecida e espera-se no mínimo a manutenção do consumo per capita brasileiro este ano.

Tabela 1. Volumes exportados totais e para China de carne suína brasileira in natura de janeiro a setembro de 2020 e dados mensais de 2019 (em toneladas). Fonte MDIC.

Um ponto de atenção no mercado interno é a redução do auxílio emergencial de 600 para 300 reais que deve afetar o consumo de alimentos em geral, porém, como no quarto trimestre as indústrias e o varejo tradicionalmente aumentam a estocagem de carnes em preparação para as vendas de final de ano, pode ser que até a virada de 2020 para 2021 não se perceba a redução da demanda e não ocorra recuo dos preços das carnes, pelo contrário, nas últimas semanas o preço do suíno tem subido (gráfico 1), com a oferta evidentemente reduzida em relação à procura. Além disso, a “safra” do boi gordo de pasto só deve iniciar no início do ano que vem, com certo retardo em relação a anos anteriores em função do atraso das chuvas no centro-sul do Brasil.


Gráfico 1. Evolução preço do suíno vivo (R$/kg vivo), em cinco estados (MG, SP, PR, RS e SC), nos últimos 60 dias (até 26/10/2020). Fonte: CEPEA.

A propósito do boi gordo, cuja arroba já ultrapassou a marca de 270 reais em algumas praças (Gráfico 2), segundo o CEPEA, a relação de troca de arrobas de boi gordo por animais de reposição (bezerro entre 8 e 12 meses) no estado de São Paulo, houve redução no poder de compra dos produtores. Na parcial de outubro, pecuaristas paulistas precisam de cerca de 8,9 arrobas para a compra de um bezerro, contra 8,7 arrobas em outubro de 2019, ou seja, diminuição de 2,5% no poder de compra. Considerando-se toda a série histórica do CEPEA, a média da relação de troca é de 7,69 arrobas por bezerro, ou seja, a relação atual está quase 16% superior. Este é mais um indicativo de que o preço do boi deve se manter em alta o que também contribui para a alta do preço do suíno.


Gráfico 2. Evolução do preço da @ do boi gordo, no estado de São Paulo, nos últimos 60 dias (até 26/10/2020). Fonte: CEPEA.

Por outro lado, o frango, embora também tenha aumentado o preço nos últimos meses, segundo levantamento do Cepea, em setembro teve a maior diferença percentual em relação às carnes de boi e suína desde que se começou a avaliar em 2004 (gráfico 3), indicando que a carne suína de fato vem conquistando espaços no mercado doméstico, mesmo com o preço em alta.


Gráfico 3. Valor do kg (R$) das carcaças bovina, suína e de frango no atacado da grande São Paulo de set/19 a set/20. No último mês a diferença proporcional entre o frango e as demais carnes foi a maior desde o início da avaliação em 2004 pelo CEPEA (fonte).

Custo de produção elevado e China provocando boom mundial de comodities

Se o preço de venda do suíno bate recordes históricos no Brasil, não é diferente com os principais insumos: milho e farelo de soja. O custo de produção não para de subir. Levantamentos realizados pela EMBRAPA- suínos e aves, indicam alta no custo de produção da ordem de mais de 42% no estado do Paraná, por exemplo, sendo que no quesito alimentação dos animais a alta foi de mais de 60% em setembro de 2020, quando comparado com setembro de 2019.

Assim como nas carnes, o REAL desvalorizado, o aumento da demanda chinesa e baixa disponibilidade de produto no mercado doméstico, seja por escassez de produto no caso da soja ou por falta de oferta no caso do milho, além do atraso do plantio da safra 2020/21, têm determinado uma “tempestade perfeita”, levando o milho e a soja a uma escalada de alta duradoura e extremamente preocupante (gráficos 4 e 5).


Gráfico 4. Evolução preço do milho (R$/saca de 60 kg), nos últimos 60 dias (até 26/10/2020). Fonte: CEPEA.
 

Gráfico 5. Evolução do preço da soja no Paraná (R$/saca de 60 kg), nos últimos 60 dias (até 26/10/2020). Fonte: CEPEA.

A CONAB divulgou em 08 de outubro o primeiro levantamento de grãos da safra 2020/21. A produção de soja foi projetada em 133,7 milhões de toneladas e a colheita total de milho deve atingir 105,2 milhões de toneladas, volumes recordes. A comercialização antecipada de grãos também vem batendo recorde no Brasil. Segundo o IMEA, a negociação antecipada da safra de soja 2020/21 de Mato Grosso, que está sendo plantada, atingiu no fim de setembro 60,4% do volume esperado, enquanto que 51% do milho mato-grossense da mesma safra já tem destinação definida. Com antecipação da comercialização de parte da safra de grãos até 2022 (alguns analistas de mercado falam em sondagens até para 2023) o setor tem que ampliar a visão dos insumos para o longo prazo. Outro ponto de atenção é o clima. Como houve atraso no plantio da primeira safra, devido à estiagem no centro-sul do Brasil, pode haver comprometimento da janela ideal de plantio da segunda safra, que responde por mais de 70% da produção de milho do país.

Neste contexto, o custo de produção em patamares elevados para os próximos anos é certo, porém a manutenção das carnes em patamares elevados nem tanto. Além das questões relacionadas a renda dos brasileiros na crise pós-pandemia, no mercado externo, a China já demonstra recuperação muito rápida do plantel de matrizes suínas, com impacto significativo na produção própria de carne já previsto para o ano que vem e maior demanda por grãos para alimentar esta retomada. Ou seja, a recuperação do rebanho suíno chinês, num primeiro momento aumenta o apetite da China pelos insumos (soja e milho), posteriormente, a produção lá volta a crescer e reduz a demanda por importação de carnes. Ainda é cedo para estimar quando exatamente isso vai acontecer. O USDA prevê um crescimento na produção de carne suína na China da ordem de em 9% em 2021. No entanto, com 41,5 milhões de toneladas, a produção ainda será quase 25% inferior aos níveis anteriores à PSA (Peste suína africana), desencadeada em meados de 2018. O fato é que a recuperação do plantel de matrizes suínas chinesas é evidente. Segundo o MBAgro, o número de matrizes que antes da PSA era de 35 milhões (em setembro de 2019) com as medidas de controle (sacrifício dos plantéis afetados pela PSA) caiu até 19 milhões, agora já está em 24 milhões de matrizes, com maior tecnificação que o perfil anterior.

Quanto à produção, ainda segundo o MBAgro, dados do governo chinês, apontam que a produção de carne suína da China aumentou 18% no terceiro trimestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019, para 8,4 milhões de toneladas. Foi o primeiro trimestre desde o intervalo julho-setembro de 2018 a mostrar um aumento de produção da proteína no comparativo anual. Apesar deste crescimento da produção no último trimestre, a China ainda tem muito a recuperar, o que pode ser percebido pela importação elevada de carne suína por parte daquele país que nos primeiros nove meses de 2020, chegou a 3,29 milhões de toneladas (Reuters/MARA-China), um aumento de 132,2% em relação ao mesmo período do ano passado, sendo que o Brasil representou ao redor de 11% deste volume somente. Se por um lado a recuperação da produção de carne suína pela China ainda está longe, por outro, aumentou o consumo de soja e milho para atender a retomada do rebanho de matrizes. Estima-se que para converter toda a suinocultura chinesa para produção em alta tecnologia são necessários cerca de 30 milhões de toneladas adicionais de soja anualmente no consumo da China. O volume de importação de soja responde por aproximadamente 90% do consumo doméstico chinês e não há espaço para o país elevar a produção interna. Ou seja, a necessidade de importação da oleaginosa seguirá crescendo.

Inflação também preocupa

Além da alta do custo do milho, farelo de soja e outros insumos atrelados ao dólar como vitaminas, aminoácidos e medicamentos veterinários, causa preocupação no setor também a pressão inflacionária na economia de modo geral. De acordo com dados divulgados pela FGV em 20 de outubro, na segunda prévia do mês, o Índice Geral de Preços Mercado (IGPM) acumula alta de 17,74% no ano de 2020 e elevação de 20,56% nos últimos 12 meses. O índice é o principal indexador de tarifas públicas e de determinados serviços. A maior parte do IGPM refere-se a preços no atacado, que costuma antecipar as variações de preços no varejo. A valorização das comodities agrícolas, desvalorização cambial do real e o déficit fiscal do governo em crescimento, são outros fatores que preocupam para determinar a pressão inflacionária sobre outros índices, como o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) que atingiu a marca de 0,64%, em setembro, sendo esta a maior taxa registrada para este mês desde 2003, quando o indicador foi de 0,78%.

Mensagem aos suinocultores

É preciso manter-se atento ao clima e à evolução do plantio da primeira safra. Aproveitar o bom momento de preço do suíno deste final ano que, embora com custo elevado, tem determinado margem positiva na atividade. A possibilidade da suspensão do auxílio emergencial em 2021 e dependência cada vez maior das exportações, principalmente para a China, pedem cautela no planejamento. Não é hora de aumentar a produção, mas sim reinvestir nas granjas, buscando a sustentabilidade no longo prazo e montar estratégias de compra antecipada de insumos, ponto cada vez mais importante na viabilidade da suinocultura brasileira.