Voltar Publicado em: segunda-feira, 22 de março de 2021, 11h48
Agravamento da pandemia e queda do poder aquisitivo pressionam cotações do suíno para baixo
Por outro lado, a produção e exportações, continuam em alta
Não há como analisar o mercado e desconectá-lo da maior crise sanitária da história recente do mundo, representada pela pandemia de covid-19. No caso específico do Brasil, soma-se a esta crise sanitária, que se agravou nas últimas semanas, obrigando os estados e municípios a estabelecerem medidas restritivas mais severas, a crise econômica, representada pela queda do PIB, aumento do desemprego e indícios de volta da inflação. Há ainda um fator muito relevante que é a perda de poder aquisitivo, especialmente nas classes menos favorecidas.
Segundo números da FGV, entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021, cerca de 17,7 milhões de pessoas voltaram à pobreza. Em agosto, a população pobre era cerca de 9,5 milhões, em fevereiro, passou para 27,2 milhões, 12,83% da população. O fim do auxílio emergencial, que injetou quase 280 bilhões de reais na economia ao longo de 2020, é um dos fatores que explicam a queda de demanda. O governo promete retornar o auxílio nas próximas semanas, porém em valores bem menores, com teto de 44 bilhões, estabelecido no Congresso Nacional.
Este cenário se refletiu no mercado de suínos, com queda nas cotações na maioria das praças no início do mês de março, apesar da entrada da massa salarial e das exportações aumentarem. O cenário está muito semelhante ao de março do ano passado, quando iniciaram as medidas restritivas para mitigar os efeitos da pandemia. Na ocasião a cadeia de produção, industrialização e varejo não estava preparada para a redução dos canais de venda, com o fechamento do food service, o que reduziu a demanda significativamente por várias semanas, achatando o preço pago ao produtor. Hoje os elos da cadeia já se adaptaram melhor a esta contingência, direcionando mais para o varejo que se mantém aberto. Por outro lado, esta segunda onda da pandemia tem como característica afetar de forma grave quase todas as regiões do país simultaneamente, enquanto no ano passado ela começou nas capitais e só depois de alguns meses interiorizou. Resta saber se a reconhecida resiliência do setor vai reverter rapidamente esta crise.
As exportações de carne in natura (Tabela 1) ganharam ritmo em fevereiro, com um aumento de 8,48% no primeiro bimestre de 2021 em relação ao mesmo período do ano passado, sendo que para a China o aumento foi da ordem de 19,17%, representando 56,7% dos embarques brasileiros nestes dois primeiros meses do ano. Em março, no acumulado das primeiras duas semanas, houve um aumento ainda maior, com embarques de 4,5 mil toneladas diárias, projetando-se fechar este mês com mais de 80 mil toneladas embarcadas, um número muito expressivo, especialmente para o início do ano, quando historicamente os volumes são inferiores às médias dos meses seguintes. Este cenário, reforça as projeções de crescimento consistente das exportações brasileiras para este ano (10%), mesmo com a recuperação do rebanho chinês. Aliás, esta recuperação do rebanho suíno da China dá sinais de desaceleração, em função de novos focos de peste suína africana e do recrudescimento de outras doenças no período de inverno lá. Recentemente, o Rabobank alertou para queda da demanda chinesa por grãos, justamente em função destas questões sanitárias.
Dados definitivos do IBGE, publicados em 18/03/21, aumentaram os números relativos a produção de carne suína brasileira no ano de 2020, com um crescimento de 8,40% em relação à 2019 em peso de carcaças e de 6,43% em cabeças abatidas, reforçando que, mais uma vez, como vem ocorrendo nos últimos anos, a carne suína é a proteína animal que mais cresce no Brasil (tabela 2). O peso médio das carcaças suínas também subiu em relação ao ano anterior (+1,65 kg/carcaça). Esta revisão dos números para cima, reforçou que o consumo per capita ano de carne suína no Brasil o ano passado foi recorde e se aproximou de 17 kg.
Também foram divulgados os números consolidados por unidade federativa (tabela 3). Houve alta no abate em 11 unidades da federação, com destaque para Santa Catarina (mais 1,68 milhão de cabeças), Paraná (mais 728 mil cabeças), Minas Gerais (mais 276 mil cabeças), Mato Grosso do Sul (mais 208 mil cabeças) e Mato Grosso (mais 187 mil cabeças). As principais quedas foram no Rio Grande do Sul (menos 79 mil cabeças), em Goiás (menos 35 mil cabeças) e em São Paulo (menos 4,4 mil cabeças). O estado de Santa Catarina foi o líder no abate de suínos em 2020, com 28,79% do abate nacional e a região sul representou 2/3 da produção brasileira.
Mesmo com projeção de safra recorde de milho e soja no Brasil, custos de produção continuam em elevação
A Conab divulgou o último levantamento de safra no dia 11 de março (tabela 4), trazendo números significativamente maiores do que todos os levantamentos anteriores, tanto para a soja, quanto para o milho, indicando safra recorde dos dois grãos.
No caso da soja, apesar do atraso no plantio a Conab estima que, em relação à safra passada, haverá um aumento ao redor de 4% na área plantada e na produtividade. O problema do atraso no plantio da soja (primeira safra), em função das chuvas na região centro-sul do Brasil é que também atrasou a safra da oleaginosa e, consequentemente o plantio da segunda safra de milho. Com uma primeira safra de milho, frustrada principalmente pela escassez de chuvas no sul do país prevista para ser a menor das últimas décadas (23,5 milhões de toneladas), toda as “fichas estão lançadas” sobre a segunda safra que, segundo a CONAB, deverá ultrapassar os 82 milhões de toneladas. Este volume considerável da segunda safra de milho deve-se principalmente ao aumento substancial da área plantada (6,7% maior que segunda safra de 2020).
Porém, para que este volume se concretize é preciso que o clima colabore, visto que o atraso no plantio deixou a cultura fora da janela climática ideal. O fato é que a menor produção de milho na primeira safra, com o aumento da demanda interna, determina um fôlego curto até a segunda safra que deve iniciar em meados de maio. Não à toa, o Indicador CEPEA apontou R$ 93,44 a saca de 60kg de milho no dia 17/03/21, em Campinas (SP), estabelecendo um novo recorde histórico. No acumulado deste ano, a valorização foi de 14% e em 12 meses, de mais de 60%. O recorde real anterior havia ocorrido em 30 de novembro de 2007, com o valor (atualizado pelo IGPDI) de R$ 92,33.
A única boa notícia relativa aos custos nas últimas semanas foi a queda do valor do farelo de soja, com a entrada da safra e o retorno das indústrias ao esmagamento da oleaginosa em maior ritmo. Em levantamento semanal feito pela ABCS junto a suas filiadas em todo o Brasil, observa-se uma queda considerável no valor médio nacional do farelo de soja, saindo de R$ 2.970,00/tonelada no início de fevereiro passado para R$ 2.575,00 na semana de 15 de março. Com estoques mundiais de milho e soja relativamente baixos em todo mundo em relação aos anos anteriores, mesmo que a safra recorde brasileira projetada pela Conab se concretize, os custos continuarão elevados, puxados pela alta demanda interna e externa e o dólar em alta.
O presidente da ABCS, Marcelo Lopes, comenta que o momento pede paciência e prudência. Se por um lado a economia está em crise e a pandemia afeta todos os setores, ainda existem boas notícias como a retomada das exportações, o aumento da produção e os números recentes do IBGE que mostram um aumento no consumo per capita de carne suína que já chega a quase 17 kg. Além disso, dados do varejo apontam que a carne suína foi a proteína que mais cresceu em vendas no último semestre, indicando que o mercado interno ainda pode surpreender a suinocultura em 2021.