Voltar Publicado em: quinta-feira, 14 de julho de 2011, 10h08
Comunicado à cadeia produtiva da suinocultura
Comunicado à cadeia produtiva da suinocultura
A ABCS recebe com alívio a decisão do CADE de aprovar, com restrições, a fusão SADIA-PERDIGÃO. O longo período de análise do processo por certo provocou incertezas no setor que, certamente não contribuíram para a estabilidade da produção de suínos. Com a decisão de ontem, 13 de julho, estabelecem-se horizontes mais definidos para a suinocultura.
Mesmo diante do conhecimento ainda parcial das análises realizadas pelo órgão de defesa da concorrência, cumpre à ABCS, no entanto, manifestar seu repúdio ao total descaso a que parecem ter sido relegadas suas preocupações oficialmente manifestadas ao CADE quanto aos possíveis efeitos dessa fusão no mercado de suínos para abate. O documento oficialmente submetido ao Conselheiro Relator e discutido em audiência em 30 de agosto de 2010 está disponível para consulta no site da ABCS. Sua tônica é a da cooperação dos produtores para que a união dessas duas prestigiosas indústrias servisse de base para o aperfeiçoamento das relações entre produtores de insumos e indústria. Lamentavelmente, o órgão regulador da concorrência, mais uma vez, ateve-se apenas ao mercado de produtos, míope e viezadamente manifestando sua preocupação apenas com parte dos eventuais afetados pela fusão, os consumidores. Inclusive, parecendo desconhecer que o domínio de mercado de fatores pode vir a ser em detrimento dos consumidores. E, aos produtores, o poder de mercado da indústria!
É surpreendente que um colegiado de doutos conselheiros desconsidere que, além do mercado de produtos, há mercado de fatores onde também deve imperar a regra da concorrência. Inclusive, na origem das preocupações legislativas na área de defesa da concorrência que resultaram no primeiro instrumento legal de defesa da concorrência, o Sherman Act de 1890 – na “pátria” do capitalismo, os Estados Unidos da América – estava, também, o objetivo de impedir o controle do preço do gado pelos frigoríficos de Chicago. Durante a discussão congressual, argumentou-se que “os trustes da carne diariamente fixam arbitrariamente o preço do gado, para o que não há apelo, uma vez que não há outro mercado”, nada muito diferente do que ainda ocorre no mercado de suínos no Brasil. Lá, nos EUA, tal legislação, considerada o “marco da liberdade econômica” vem sendo sucessivamente aperfeiçoada, sempre no sentido de limitar a concentração econômica, encorajando o empreendedorismo americano e protegendo pequenos empresários e consumidores.
A ABCS expôs de maneira clara e objetiva suas preocupações com o possível agravamento da influência que as empresas, agora unidas na BRF, têm sobre o mercado de suínos no Brasil. Foi claramente contradito o argumento de que, com o fornecimento de animais dessas empresas feito por produtores integrados, não há interferência no mercado. Como as integradoras também compram e vendem animais e, sobretudo, divulgam seus preços de pagamento aos integrados, insofismavelmente elas balizam o mercado. Há extensa e consolidada teoria econômica e evidência empírica desse fato. Ademais, exemplificaram-se as conhecidas e históricas práticas de coordenação de preços praticadas pelos sindicatos estaduais das indústrias frigoríficas.
Sobretudo, de forma eminentemente pró-ativa, a ABCS ofereceu sugestões de procedimentos que o CADE poderia impor às Requerentes como itens de Compromisso de Desempenho, nos termos do Art. 58 da Lei 8.884/94. Tais sugestões parecem ter sido solenemente ignoradas, o que certamente provoca a mais justa indignação dos produtores. Foi assim inexplicavelmente perdida oportunidade de induzir o aperfeiçoamento da competição no mercado de suínos para abate. As condições de total laisser faire e indevida coordenação nesse mercado vêm levando à dizimação da produção familiar e elevando a escala mínima de produção dos integrados a níveis praticamente desconhecidos na suinocultura mundial.
Mais uma vez a ABCS reitera que, desde a submissão do Ato de Concentração, ressaltou os aspectos positivos da fusão proposta e não procedeu de qualquer maneira que pudesse dificultá-la. Manifestamo-nos, sobretudo nos Autos, apenas no sentido do aperfeiçoamento da competição no mercado de suínos. O ainda aparente descaso total do CADE com este relevante aspecto da fusão merece nosso veemente repúdio, nos frustra e levanta dúvidas sobre a efetividade desse imprescindível órgão do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência.
Brasília, 14 de julho de 2011
Marcelo Lopes
Presidente da ABCS